Rainha do Rosa
sob os ventos do fim de tarde, uma agonia desesperada adormecida começara a desfragmentar-se de meus ânimos e algozes...
oh areia... oh céu...
vedes tu quem é ela para que saiba um talvez. um outrem.
as areias antes tímidas e desaparecidas envoltaram todo meu raio de percepção...
era uma ressureição. coisa que só acontece a cada mil anos ou duas vezes na vida do homem... o corpo, os lábios, seus ares e crishinas enfeitiçavam o vento que soprava entre as ondas e montanhas.
serei tapete. pés. enfeitiçado a rodar pelos teus passos deusa?
um olhar de mariposa adormecida, em veraneio de vespa ferrenha, das melhores febres, daquelas que os líquidos escorrem pelo ferrão... te darei veemencia minha senhorita. sempre na primeira fila... na primeira onda... para que meus olhos em te pousem e abrace teus sonhos sujos, tua consciência ignorante, seus ridos e teu ardor íntimo, impulsivo, abstrato, do qual estarei sempre fiel a tuas ordens.
deusa das areias. moça de craridez. cândida. complacida de paz exterior interiorizada, como um espelho que usas só pra refletir as imagens que nunca voltam...
oh areias... oh céus... oh Cléo...
andas tão serena fora dos grilhões,
que nem tem validade para uma rainha,
és uma mulher, sem coroas, tridentes, tronos...
mostrando ser, uma simples, doce e faminta mulher.
a vida pouco me disse Marco Antônio... mas o que a ciência tem mostrado é superior por não conhecê-la. a finura, magra e bela, esbelta, dura, enrijecida com carnes para ser descobertas faz-me ver um corpo tão fantasioso quanto seus pequeninos pés...
pisando macio. com rastros entre as ondas e areias, sobre o tapete dos mares as tuas pegadas apagam-se com ventos, e as marés cada dia mais altas desejam apagar todas tuas passagens, quer deixar sobre meus pensamentos os caminhos de teu andar. leve andar...
por onde vou... por tantas mulheres que já vi, nunca serão como as daqui... se os raios dourados de tuas terras passadas podem ser vividas sobre este esplendor de lugar, se tu quiseres é claro... é meu simples lugar... e quem sou eu para oferecer-te um olhar de vida e lugar diante tudo? se és minha preciosidade... relíquia que deve ser possuída. nunca guardada à meros olhares que te vê como algo intocável, de imenso respeito, pois tudo que é belo além de se olhar; merece muitos toques, passes e apertos... não estou vendo uma estátua, imóvel, que espera incondicionalmente um olhar petrificado que contempla as belezas mais raras, sobrenatural mesmo será o dia em que eu adentrar os ares deste teu ventre.
Nifertite teria mil ciúmes, duas mil invejas e algumas infinitas especulações de arrependimento se visse o que tens de todas as rainhas dos desertos... por estas areias de vida ampla e quente, as águas te esperam mornamente com infinita paciência do cheiro emanado pelo fumo que você balbucia, esses seus passos tímidos me faz viajar no estado vago em que vivi por alguns meses, faz tempo, faz muitos sábados e domingos que meus dias não mudavam... sem feriado algum tu me paraste. e parece que agora, à de vir dias diferentes. enfim...
tu és dona desta razão sem piedade,
no peito do poema, no bico de teus seios,
em cada pelo que se arrepia, em cada cabelo que move-se,
a ternura de ti corre, e o chão abaixo de mim abre-se...
na dourada cor de ouro.
se queres pirâmides, blocos de energias, placas tectónicas, o magnetismo apossou-se e acorrenta-me... beleza maior deste pobre negro, escravo, mestiço, é aos pés da nobre rainha que sempre terá belas sapatilhas, com sua devida atenção, escutando as realizações impossíveis de um contexto que nunca vou querer mudar, a coroa de nada vale santa minha, de ti só quero teu corpo. e os pezinhos... não para sempre. não por instantes. por mais que te ofereçam reinos, teu amor real pode estar naquele te escuta.
de um verão resta-me uma seda como destino para fumar, escrever...
Humberto Fonseca